Muitas pragas afligiram a humanidade ao longo dos tempos. Sabe-se, por exemplo, de nações que ficaram ‘de joelhos’, abalados pelo flagelo da peste bubônica, hanseníase, cólera. No passado, muitas dessas epidemias deixaram um rastro de morte e luto porque a medicina ainda não evoluíra o suficiente para erradicá-las. Hoje há outros tipos de doenças. Felizmente, nossa medicina evoluiu muito. Já se ouve falar de outros tipos de terapias além da conhecida alopatia.
Há dois milênios Jesus falou de um tipo de doença que atordoaria a humanidade nos tempos futuros. Ele falou de uma ‘insensibilidade’ que causaria uma apatia generalizada. Nas palavras do Nazareno ouvimos: “Tomai cuidado para que vossos corações não fiquem insensíveis!” (Lc 21,34). Acredito que essa exortação corresponda a uma das realidades mais duras que assistimos nos dias atuais.
A sensibilização de inteiras nações diante de povos arrasados por furacões e tsunamis. A comoção internacional por homens que passaram semanas soterrados num túnel, nas profundezas da terra. A histeria coletiva que gerou revolta por ver crianças assassinadas pelos próprios pais ou jovens moças assassinadas, esquartejadas e entregues como carne a animais. Tudo isso suscitou muitos sentimentos em todos nós. É bonito ver esse tipo de preocupação. Todavia, de pouco adianta ‘mover o mundo’ por causa de quem está distante se não nos damos conta dos sofrimentos ou carências dos que estão perto, ou mesmo de nós mesmos.
Ainda se vê gente que faz violência e mata por causa de um pequeno acidente no trânsito. Irmãos que não se falam por causa de uma herança deixada. Vizinhos que se odeiam por causa de um saco de lixo. Famílias inteiras que veneram programas televisivos que exploram todo tipo de banalidades. Casais que se separam por causa de uma suspeita. Fiéis que abandonam a fé por causa de um boato. Até que ponto podemos medir nossa ‘sensibilidade’? Vale a pena olhar para fora e esquecer o que trazemos dentro?
Não somos capazes de mudar o mundo a não ser que possamos melhorar o ‘mundo’ que trazemos dentro de nós. É bom evitar os sofrimentos da humanidade, mas é muito melhor fazer isso sem se esquecer de si mesmo. Nosso coração andará errante e insatisfeito enquanto não encontrar aquela Verdade que cala nossas dúvidas interiores. Há muitas teorias, filosofias e ideologias espalhadas por aí. No entanto nenhuma delas foi capaz de gerar pessoas que se sensibilizaram com os outros sem deixar de cuidar de si mesmos. Nosso país tem vários exemplos: Irmã Dulce, na Bahia. Frei Galvão, em São Paulo. Paulina, em Santa Catarina. Os santos não eram pessoas ‘impecáveis’. Os santos – como disse Nelson Mandela – foram grandes pecadores que não desistiram de lutar. As palavras de Jesus têm força para gerar pessoas desse calibre. Homens e mulheres que ‘choraram com os que choram’, mas não se esqueceram de assumir ‘a própria verdade’, cuidando do ‘mundo interior’ para melhor agir no ‘mundo exterior’. A fé sem obras é morta. As obras sem fé são estéreis. O pior doente é aquele que jura que não o é, mesmo reconhecendo os sintomas que o aflige. Hoje, mais do que nunca, temos de olhar para nós e nos perguntarmos: em que ponto está a minha ‘sensibilidade’?
Seu irmão,
Pe Delton Filho