“Pedro se escandaliza com as palavras do Mestre e tenta dissuadi-Lo de prosseguir o seu caminho. A cruz nunca está na moda: ontem, como hoje. Mas cura por dentro”, disse Francisco em sua homilia.
O Papa Francisco celebrou, neste domingo (12/09), a missa de encerramento do 52º Congresso Eucarístico Internacional, na Praça dos Heróis, em Budapeste, na Hungria. Segundo as autoridades locais, participaram da missa cem mil pessoas nos setores organizados.
«E vocês, quem dizem que eu sou?» Esta pergunta de Jesus aos discípulos e também a nós hoje norteou a homilia do Santo Padre. Marca uma virada no caminho de sequela do Mestre.
Os discípulos conheciam bem Jesus, “conviviam familiarmente com Ele, foram testemunhas de muitos dos milagres realizados, ficavam maravilhados com o seu ensinamento. Contudo, ainda não pensavam como Ele. Faltava uma passagem decisiva, ou seja, da admiração por Jesus à imitação de Jesus”.
Esta pergunta de Jesus, dirigida a cada um de nós, “pede não apenas uma resposta exata do ponto de vista do Catecismo, mas uma resposta pessoal, de vida. Dessa resposta, nasce a renovação do discipulado”. Segundo o Papa, esta “renovação realiza-se através de três passagens que fizeram os discípulos e que podemos realizar também nós: o anúncio de Jesus, o discernimento com Jesus e o caminho atrás de Jesus”.
O anúncio de Jesus
A resposta de Pedro a essa pergunta de Jesus é «Tu és o Messias». “Em poucas palavras, Pedro disse tudo. A resposta está certa, mas surpreendentemente, depois de tal reconhecimento, Jesus ordena severamente que «não dissessem isto a ninguém».” Por quê? “Por uma razão concreta: dizer que Jesus é o Messias, o Cristo, é exato, mas incompleto. Existe sempre o risco de anunciar um falso messianismo: aquele segundo os homens e não segundo Deus. Por isso, a partir daquele momento, Jesus começa a revelar a sua identidade: a identidade pascal, aquela que encontramos na Eucaristia. Explica que a sua missão havia certamente de culminar na glória da ressurreição, mas passando pela humilhação da cruz. Jesus impõe silêncio sobre a sua identidade messiânica, mas não sobre a cruz que o espera.”
Perante este anúncio de Jesus, um anúncio surpreendente, também nós podemos sentir-nos apavorados. Nós também, gostaríamos de um messias poderoso, em vez dum servo crucificado. Diante de nós está a Eucaristia, para nos recordar quem é Deus; não o faz com palavras, mas de modo concreto, mostrando-nos Deus como Pão partido, como Amor crucificado e doado. Podemos acrescentar muitas cerimônias, mas o Senhor permanece ali na simplicidade dum Pão que se deixa partir, distribuir e comer. Para nos salvar, se faz-servo; para nos dar vida, morre. Faz-nos bem deixar-nos surpreender pelo anúncio de Jesus; e aqui abre-se a segunda passagem.
O discernimento com Jesus
“Diante do anúncio do Senhor, a reação de Pedro é tipicamente humana: quando aparece a cruz, a perspectiva do sofrimento, o homem se revolta. Pedro se escandaliza com as palavras do Mestre e tenta dissuadi-Lo de prosseguir o seu caminho. A cruz nunca está na moda: ontem, como hoje. Mas cura por dentro”, disse o Papa, acrescentando:
É diante do Crucificado que experimentamos uma benéfica luta interior, um áspero conflito entre «pensar segundo Deus» e «pensar segundo os homens». Dum lado, temos a lógica de Deus, que é a do amor humilde; o caminho de Deus evita qualquer imposição, ostentação e triunfalismo, visa sempre o bem dos outros, indo até ao sacrifício de si mesmo. Do outro, temos o «pensar segundo os homens»: é a lógica do mundo, presa às honras e privilégios, tendente ao prestígio e ao sucesso. O que conta aqui são a relevância e a força, aquilo que chama a atenção da maioria e sabe afirmar-se perante os outros. Ofuscado por esta perspectiva, Pedro chama Jesus à parte e começa a repreendê-Lo. Pode acontecer também conosco chamar o Senhor «à parte», colocá-Lo num canto do coração, continuando a considerar-nos pessoas religiosas e boas, e prosseguir pelo nosso caminho sem nos deixarmos conquistar pela lógica de Jesus.
Entretanto, Ele nos acompanha nesta luta interior, porque deseja que nós, como os Apóstolos, escolhamos a sua parte. Há a parte de Deus, como há a parte do mundo… A diferença não está entre quem é religioso e quem não o é; a diferença crucial está entre o Deus verdadeiro e o deus que é o nosso eu. Que grande distância existe entre Aquele que reina silenciosamente na cruz e aquele falso deus que gostaríamos de ver reinar pela força e reduzir ao silêncio os nossos inimigos! Como é diferente Cristo, que se propõe a nós só com amor, comparado com os messias poderosos e vencedores, lisonjeados pelo mundo!
“Jesus nos sacode, não se contenta com declarações de fé, pede-nos que purifiquemos a nossa religiosidade diante da sua cruz, diante da Eucaristia. Faz-nos bem permanecer em adoração diante da Eucaristia, para contemplarmos a fragilidade de Deus. Dediquemos tempo à adoração”, disse ainda o Papa. “Deixemos que Jesus, Pão vivo, cure os nossos fechamentos e nos abra à partilha: nos cure da rigidez e de nos fecharmos em nós mesmos, nos livre da escravidão paralisante da defesa da nossa imagem e nos inspire a segui-Lo para onde Ele nos quer conduzir. Assim chegamos à terceira passagem.”
O caminho atrás de Jesus
“O caminho cristão não é uma corrida ao sucesso, mas começa com um passo atrás, com a descentralização que liberta, com o retirar-se do centro da vida. Então Pedro reconhece que o centro não é «o seu Jesus», mas o verdadeiro Jesus. Voltará a cair, mas de perdão em perdão irá reconhecendo cada vez melhor o rosto de Deus e passará duma admiração estéril por Cristo à imitação concreta de Cristo”, disse ainda o Papa que fez a seguinte pergunta: “O que significa caminhar atrás de Jesus?”
É avançar na vida com a sua própria confiança, a de sermos filhos amados de Deus. É percorrer o mesmo caminho do Mestre, que veio para servir e não para ser servido. É dirigir a cada dia os nossos passos ao encontro do irmão. A isto nos impele a Eucaristia: a sentir-nos um só Corpo, a fazer-nos em pedaços para os outros.
“Deixemos que o encontro com Jesus na Eucaristia nos transforme, como transformou os grandes e corajosos Santos Estêvão e Santa Isabel. À semelhança deles, não nos contentemos com pouco; não nos resignemos com uma fé que vive de ritos e repetições, abramo-nos à novidade escandalosa de Deus crucificado e ressuscitado, Pão partido para dar vida ao mundo”, concluiu.
Mariangela Jaguraba – Vatican News