PRIMEIRA ESTAÇÃO
JESUS É CONDENADO À MORTE
V. Adoramus te, Christe, et benedicimus tibi.
R. Quia per sanctam crucem tuam redemisti mundum.
Do Evangelho de S. Marcos 15, 14-15
Eles gritaram ainda mais: “Crucifica-O!”.
Pilatos, desejoso de agradar à multidão,
soltou-lhes Barrabás
e, depois de mandar açoitar Jesus,
entregou-O para ser crucificado.
MEDITAÇÃO
A sentença de Pilatos foi proferida sob pressão dos sacerdotes e da multidão. A condenação à morte por crucifixão serviria para satisfazer as suas paixões dando resposta ao grito: “Crucifica-O! Crucifica-O!” (Mc 15, 13-14; etc.). O pretor romano pensou que podia subtrair-se à sentença lavando-se as mãos, como antes se desinteressara das palavras de Cristo que tinha identificado o seu reino com a verdade, com o testemunho da verdade (Jo 18, 38). Num caso e noutro, Pilatos procurava conservar a sua independência, ficar de qualquer modo “de fora”. Mas, só na aparência… A Cruz, à qual foi condenado Jesus de Nazaré (Jo 19, 16), tal como a sua verdade do reino (Jo 18, 36-37) deviam tocar no mais fundo da alma do pretor romano. Tratou-se e trata-se duma Realidade, diante da qual é impossível ficar de fora ou à margem. O facto de Jesus, o Filho de Deus, ter sido interrogado sobre o seu reino e por isso ter sido julgado pelo homem e condenado à morte, constitui o princípio daquele testemunho final de Deus que tanto amou o mundo (cf. Jo 3, 16).
Nós encontramo-nos perante este testemunho e sabemos que não nos é lícito lavar as mãos.
ACLAMAÇÕES
Jesus de Nazaré, condenado à morte de cruz,
testemunha fiel do amor do Pai.
R. Kyrie, eleison.
Jesus, Filho de Deus, obediente à vontade do Pai
até à morte de cruz.
R. Kyrie, eleison.
Todos:
Pater noster, qui es in cælis;
sanctificetur nomen tuum;
adveniat regnum tuum;
fiat voluntas tua, sicut in cælo et in terra.
Panem nostrum cotidianum da nobis hodie;
et dimitte nobis debita nostra,
sicut et nos dimittimus debitoribus nostris;
et ne nos inducas in tentationem;
sed libera nos a malo.
Stabat Mater dolorosa
iuxta crucem lacrimosa,
dum pendebat Filius.
SEGUNDA ESTAÇÃO
JESUS É CARREGADO COM A CRUZ
V. Adoramus te, Christe, et benedicimus tibi.
R. Quia per sanctam crucem tuam redemisti mundum.
Do Evangelho de S. Marcos 15, 20
Depois de O terem escarnecido,
tiraram-Lhe o manto de púrpura
e vestiram-Lhe as suas roupas.
Levaram-No, então,
para O crucificarem.
MEDITAÇÃO
Começa a execução, ou seja, a actuação da sentença. Condenado à morte, Cristo tem de carregar a cruz, como os outros dois condenados que devem sofrer a mesma pena: “Foi contado entre os malfeitores” (Is 53, 12). Cristo aproxima-Se da Cruz, tendo todo o corpo terrivelmente dilacerado e pisado, e com o sangue que da cabeça coroada de espinhos Lhe escorre pelo rosto. Ecce Homo! (Jo 19, 5). N’Ele está toda a verdade do Filho do Homem que os profetas predisseram, a verdade sobre o Servo de Jahvé anunciada por Isaías: “Foi esmagado pelas nossas iniquidades; (…) fomos curados nas suas chagas” (Is 53, 5).
N’Ele está presente também uma certa consequência, que nos deixa estupefactos, daquilo que o homem fez ao seu Deus. Pilatos diz: “Ecce Homo” (Jo 19, 5); “vede o que fizestes deste homem!” Nesta afirmação, parece falar outra voz, como se dissesse: “Vede o que fizestes, neste homem, ao vosso Deus!”
É impressionante a sobreposição, a inter-relação desta voz que ouvimos através da história com aquilo que nos chega através da certeza da fé. Ecce Homo! Jesus, “chamado Cristo” (Mt 27, 17), toma a Cruz sobre os seus ombros (Jo 19, 17). Começou a execução.
ACLAMAÇÕES
Cristo, Filho de Deus,
que revelais ao homem o mistério do homem.
R. Kyrie, eleison.
Jesus, servo do Senhor,
pelas vossas chagas fomos curados.
R. Kyrie, eleison.
Todos:
Pater noster, qui es in cælis;
sanctificetur nomen tuum;
adveniat regnum tuum;
fiat voluntas tua, sicut in cælo et in terra.
Panem nostrum cotidianum da nobis hodie;
et dimitte nobis debita nostra,
sicut et nos dimittimus debitoribus nostris;
et ne nos inducas in tentationem;
sed libera nos a malo.
Cuius animam gementem,
contristatam et dolentem
pertransivit gladius.
TERCEIRA ESTAÇÃO
JESUS CAI PELA PRIMEIRA VEZ
V. Adoramus te, Christe, et benedicimus tibi.
R. Quia per sanctam crucem tuam redemisti mundum.
Do livro do profeta Isaías 53, 4-6
Na verdade, ele tomou sobre si as nossas doenças,
carregou as nossas dores;
nós o reputávamos como um leproso,
ferido por Deus e humilhado.
Mas foi castigado pelos nossos crimes,
esmagado pelas nossas iniquidades;
o castigo que nos salva pesou sobre ele,
fomos curados nas suas chagas.
Todos nós andávamos desgarrados como ovelhas,
cada um seguia o seu caminho;
o Senhor carregou sobre ele
a iniquidade de todos nós.
MEDITAÇÃO
Jesus cai sob a Cruz. Cai por terra. Não recorre às suas forças sobre-humanas, não recorre à força dos anjos. “Julgas que não posso rogar a meu Pai, que imediatamente Me enviaria mais de doze legiões de anjos?” (Mt 26, 53). Mas não o pede. Tendo aceite o cálice das mãos do Pai (Mc 14, 36; etc.), quer bebê-lo até ao fundo. É isto mesmo o que quer. E por isso não pensa em quaisquer forças sobre-humanas, embora estejam ao seu dispor. Poderão provar estranheza aqueles que O tinham visto quando comandava às enfermidades humanas, às mutilações, às doenças, à própria morte. E agora? Nega Ele tudo isto? E todavia “nós esperávamos…”, dirão alguns dias depois os discípulos de Emaús (cf. Lc 24, 21). “Se és Filho de Deus…” (Mt 27, 40), hão-de provocá-Lo os membros do Sinédrio. “Salvou os outros, e não pode salvar-Se a Si mesmo” (Mc 15, 31; Mt 27, 42): gritará a multidão.
E Ele aceita estas provocações, que parecem anular todo o sentido da sua missão, dos discursos pronunciados, dos milagres realizados. Aceita todas aquelas palavras; decidiu não opor-Se. Quer ser ultrajado. Quer vacilar. Quer cair sob a Cruz. Quer. É fiel até ao fim, mesmo nos mínimos detalhes, a esta afirmação: “Não se faça o que Eu quero, mas o que Tu queres” (Mc 14, 36; etc.).
Deus extrairá a salvação da humanidade das quedas de Cristo sob a Cruz.
ACLAMAÇÕES
Jesus, manso Cordeiro redentor,
que carregais sobre vós o pecado do mundo.
R. Kyrie, eleison.
Jesus, nosso companheiro no tempo da angústia,
solidário com a fragilidade humana.
R. Kyrie, eleison.
Todos:
Pater noster, qui es in cælis;
sanctificetur nomen tuum;
adveniat regnum tuum;
fiat voluntas tua, sicut in cælo et in terra.
Panem nostrum cotidianum da nobis hodie;
et dimitte nobis debita nostra,
sicut et nos dimittimus debitoribus nostris;
et ne nos inducas in tentationem;
sed libera nos a malo.
O quam tristis et afflicta
fuit illa benedicta
Mater Unigeniti!
QUARTA ESTAÇÃO
JESUS ENCONTRA SUA MÃE
V. Adoramus te, Christe, et benedicimus tibi.
R. Quia per sanctam crucem tuam redemisti mundum.
Do Evangelho de S. Lucas 2, 34-35.51
Simeão abençoou-os e disse a Maria, sua mãe:
“Este Menino está aqui para queda
e ressurgimento de muitos em Israel
e para ser sinal de contradição;
uma espada trespassará a tua alma,
a fim de se revelarem os pensamentos de muitos corações”…
Sua mãe guardava todas estas coisas no seu coração.
MEDITAÇÃO
A Mãe. Maria encontra o Filho a caminho da Cruz. A sua cruz torna-se a cruz d’Ela; a humilhação d’Ele é a sua, o opróbrio público torna-se o d’Ela. É a ordem humana das coisas. Assim o devem sentir aqueles que A rodeiam, e assim o entende o coração d’Ela: “Uma espada trespassará a tua alma” (Lc 2, 35). As palavras pronunciadas quando Jesus tinha quarenta dias, cumpriam-se neste momento. Atingem agora toda a sua plenitude. E Maria, trespassada por esta espada invisível, encaminha-se para o Calvário do seu Filho, para o seu próprio Calvário. A devoção cristã vê-A com esta espada no coração, e assim A representa e modela. Mãe das Dores!
“Ó Vós que sofrestes com Ele!” – repetem os fiéis, sentindo no seu íntimo que é assim mesmo que se deve exprimir o mistério deste sofrimento. Embora esta dor Lhe pertença e A toque mesmo no fundo da sua maternidade, todavia a verdade plena deste sofrimento é expressa pelo termo compaixão. Faz parte do próprio mistério: exprime de certo modo a unidade com o sofrimento do Filho.
ACLAMAÇÕES
Santa Maria, mãe e irmã nossa no caminho de fé,
convosco invocamos o vosso Filho Jesus.
R. Kyrie, eleison.
Santa Maria, intrépida a caminho do Calvário,
convosco suplicamos o vosso Filho Jesus.
R. Kyrie, eleison.
Todos:
Pater noster, qui es in cælis;
sanctificetur nomen tuum;
adveniat regnum tuum;
fiat voluntas tua, sicut in cælo et in terra.
Panem nostrum cotidianum da nobis hodie;
et dimitte nobis debita nostra,
sicut et nos dimittimus debitoribus nostris;
et ne nos inducas in tentationem;
sed libera nos a malo.
Quæ mærebat et dolebat,
pia Mater, dum videbat
Nati pœnas incliti.
QUINTA ESTAÇÃO
JESUS É AJUDADO PELO CIRENEU A LEVAR A CRUZ
V. Adoramus te, Christe, et benedicimus tibi.
R. Quia per sanctam crucem tuam redemisti mundum.
Do Evangelho de S. Marcos 15, 21-22
Requesitaram, para Lhe levar a cruz,
um homem que passava, vindo do campo,
Simão de Cirene, pai de Alexandre e de Rufo.
Conduziram Jesus ao lugar do Gólgota,
que quer dizer “Lugar do Crânio”.
MEDITAÇÃO
Simão de Cirene, designado para levar a Cruz (cf. Mc 15, 21; Lc 23, 26), certamente não queria levá-la. Por isso teve de ser obrigado. Caminhava ao lado de Cristo sob o mesmo peso. Emprestava-Lhe os seus ombros, sempre que os ombros do condenado pareciam vacilar. Estava perto d’Ele: mais perto do que Maria, mais perto que João, o qual, embora sendo homem, não foi chamado para O ajudar. Chamaram-no a ele, Simão de Cirene, pai de Alexandre e de Rufo, como refere o Evangelho de S. Marcos. Chamaram-no, forçaram-no.
Quanto durou este constrangimento? Quanto tempo terá caminhado ao lado de Jesus, fazendo sentir que nada tinha a ver com o condenado, com a sua culpa, com a sua pena? Quanto tempo terá passado assim, interiormente dividido, atrás duma barreira de indiferença para com o Homem que sofria? “Estava nu, tive sede, estive na prisão” (cf. Mt 25, 35.36), levei a Cruz… e tu levaste-a Comigo? Levaste-a Comigo verdadeiramente até ao fim?
Não se sabe. S. Marcos refere apenas o nome dos filhos de Cireneu e a tradição afirma que pertenciam à comunidade dos cristãos ligada a S. Pedro (cf. Rm 16, 13).
ACLAMAÇÕES
Cristo, bom samaritano,
fostes ao encontro do pobre, do doente, do último.
R. Kyrie, eleison.
Cristo, servo do Eterno, considerais como feito a Vós
cada gesto de amor para com o refugiado, o marginalizado, o estrangeiro.
R. Kyrie, eleison.
Todos:
Pater noster, qui es in cælis;
sanctificetur nomen tuum;
adveniat regnum tuum;
fiat voluntas tua, sicut in cælo et in terra.
Panem nostrum cotidianum da nobis hodie;
et dimitte nobis debita nostra,
sicut et nos dimittimus debitoribus nostris;
et ne nos inducas in tentationem;
sed libera nos a malo.
Quis est homo qui non fleret,
Matrem Christi si videret
in tanto supplicio?
SEXTA ESTAÇÃO
A VERÓNICA LIMPA O ROSTO DE JESUS
V. Adoramus te, Christe, et benedicimus tibi.
R. Quia per sanctam crucem tuam redemisti mundum.
Do livro do profeta Isaías 53, 2-3
Cresceu (…) sem figura nem beleza.
Vimo-lo sem aspecto atraente,
desprezado e evitado pelos homens,
homem das dores, experimentado nos sofrimentos:
diante do qual se tapa o rosto,
menosprezado e desestimado.
MEDITAÇÃO
A tradição fala-nos da Verónica. Talvez aquela complete a história do Cireneu. Na verdade, embora – mulher que era – não tenha levado fisicamente a Cruz nem a isso tenha sido forçada, o certo é que esta Cruz com Jesus, ela a levou: levou-a como podia, como lhe era possível fazer naquele momento e como lho ditava o coração, isto é, enxugando o seu Rosto.
A explicação deste facto, referido pela tradição, parece fácil também: no lenço com que ela Lhe enxugou o Rosto, ficaram gravadas as feições de Cristo. Precisamente porque estava todo ensanguentado e soado, podia deixar traços e lineamentos.
Mas, o sentido deste acontecimento pode ser interpretado também doutra maneira, se o analisarmos à luz do discurso escatológico de Cristo. Serão muitos, sem dúvida, aqueles que vão perguntar: “Senhor, quando é que fizemos isto?”. E Jesus responderá: “Sempre que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, a Mim mesmo o fizestes” (cf. Mt 25, 37-40). De facto, o Salvador imprime a sua imagem em cada acto de caridade, como o fez no lenço de Verónica.
ACLAMAÇÕES
Ó Rosto do Senhor Jesus,
desfigurado pela dor, resplandecente da glória divina.
R. Kyrie, eleison.
Ó Rosto sagrado,
impresso como um selo em cada gesto de amor.
R. Kyrie, eleison.
Todos:
Pater noster, qui es in cælis;
sanctificetur nomen tuum;
adveniat regnum tuum;
fiat voluntas tua, sicut in cælo et in terra.
Panem nostrum cotidianum da nobis hodie;
et dimitte nobis debita nostra,
sicut et nos dimittimus debitoribus nostris;
et ne nos inducas in tentationem;
sed libera nos a malo.
Quis non posset contristari,
Christi Matrem contemplari,
dolentem cum Filio?
SÉTIMA ESTAÇÃO
JESUS CAI PELA SEGUNDA VEZ
V. Adoramus te, Christe, et benedicimus tibi.
R. Quia per sanctam crucem tuam redemisti mundum.
Do livro das Lamentações 3, 1-2.9.16
Eu sou o homem que conheceu a aflição,
sob a vara do seu furor.
Conduziu-me e fez-me caminhar
nas trevas e não na claridade. (…)
Fechou-me o caminho com pedras silhares
e subverteu as minhas veredas. (…)
Quebrou-me os dentes com uma pedra
e mergulhou-me na cinza.
MEDITAÇÃO
“Eu sou um verme e não um homem, o opróbrio dos homens e a abjecção da plebe” (Sal 22/21, 7): as palavras do profeta-salmista cumprem-se plenamente nestas vielas estreitas e árduas de Jerusalém, durante as últimas horas que antecedem a Páscoa. Sabe-se que estas horas, antes da festa, são enervantes e que as estradas estão apinhadas. É neste contexto que se cumprem as palavras do salmista, embora ninguém o pense. Certamente não se dão conta disto aqueles que demonstram desprezo à vista deste Jesus de Nazaré que cai pela segunda vez sob a Cruz, tornando-Se para eles objecto de opróbrio.
É Ele que o deseja; quer que se cumpra a profecia. Por isso, cai exausto pelo esforço feito. Cai por vontade do Pai, vontade expressa também nas palavras do Profeta. Cai por sua vontade própria, porque “como se cumpririam então as Escrituras?” (Mt 26, 54). “Eu sou um verme e não um homem” (Sal 22/21, 7), e consequentemente nem sequer o “Ecce Homo” (Jo 19, 5), sou menos ainda, ainda pior…
O verme rasteja no meio da terra; ao contrário, o homem, como rei das criaturas, caminha por cima dela. O verme também rói a madeira: como o verme, o remorso do pecado rói a consciência do homem. Remorso pela segunda queda.
ACLAMAÇÕES
Jesus de Nazaré, que Vos tornastes a infâmia dos homens,
para enobrecer todas as criaturas.
R. Kyrie, eleison.
Jesus, servidor da vida,
esmagado pelos homens, exaltado por Deus.
R. Kyrie, eleison.
Todos:
Pater noster, qui es in cælis;
sanctificetur nomen tuum;
adveniat regnum tuum;
fiat voluntas tua, sicut in cælo et in terra.
Panem nostrum cotidianum da nobis hodie;
et dimitte nobis debita nostra,
sicut et nos dimittimus debitoribus nostris;
et ne nos inducas in tentationem;
sed libera nos a malo.
Pro peccatis suæ gentis,
vidit Iesum in tormentis,
et flagellis subditum.
OITAVA ESTAÇÃO
JESUS ENCONTRA AS MULHERES DE JERUSALÉM
V. Adoramus te, Christe, et benedicimus tibi.
R. Quia per sanctam crucem tuam redemisti mundum.
Do Evangelho de S. Lucas 23, 28-31
Jesus voltou-Se para elas e disse-lhes:
“Filhas de Jerusalém, não choreis por Mim;
chorai antes por vós mesmas e pelos vossos filhos,
pois dias virão em que se dirá:
“Felizes as estéreis, os ventres que não geraram
e os peitos que não amamentaram”.
Hão-de então dizer aos montes:
“Caí sobre nós”, e às colinas: “Cobri-nos”.
Porque se tratam assim a madeira verde,
o que acontecerá à seca?”
MEDITAÇÃO
Eis o apelo ao arrependimento, ao verdadeiro arrependimento, à compunção, na verdade do mal cometido. Jesus diz às filhas de Jerusalém que choram, ao vê-Lo passar: “Não choreis por Mim; chorai antes por vós mesmas e pelos vossos filhos” (Lc 23, 28). Não se pode ficar pela superfície do mal; é preciso chegar até ao fundo das suas raízes, das causas, da verdade da consciência.
É isto mesmo que quer dizer Jesus que leva a Cruz, Ele que desde sempre “conhecia o interior de cada homem” (cf. Jo 2, 25) e sempre o conhece. Por isso, Ele deve permanecer sempre como a testemunha mais directa dos nossos actos e dos juízos que fazemos sobre eles na nossa consciência. Talvez nos faça compreender que estes juízos devem ser ponderados, razoáveis, objectivos – diz: “Não choreis” – mas, ao mesmo tempo, consequentes com tudo o que esta verdade contém: avisa-nos porque é Ele que leva a Cruz.
Peço-Vos, Senhor, que saiba viver e caminhar na verdade!
ACLAMAÇÕES
Senhor Jesus, sábio e misericordioso,
Verdade que conduzis à vida.
R. Kyrie, eleison.
Senhor Jesus, cheio de compaixão,
a vossa presença suaviza o pranto na hora da prova.
R. Kyrie, eleison.
Todos:
Pater noster, qui es in cælis;
sanctificetur nomen tuum;
adveniat regnum tuum;
fiat voluntas tua, sicut in cælo et in terra.
Panem nostrum cotidianum da nobis hodie;
et dimitte nobis debita nostra,
sicut et nos dimittimus debitoribus nostris;
et ne nos inducas in tentationem;
sed libera nos a malo.
Tui Nati vulnerati,
tam dignati pro me pati
pœnas mecum divide.
NONA ESTAÇÃO
JESUS CAI PELA TERCEIRA VEZ
V. Adoramus te, Christe, et benedicimus tibi.
R. Quia per sanctam crucem tuam redemisti mundum.
Do livro das Lamentações 3, 27-32
É bom para o homem carregar o jugo,
desde a sua mocidade.
É bom ele sentar-se solitário e silencioso,
quando o Senhor lho impuser;
pôr a sua boca no pó,
onde talvez encontre esperança;
estender a face a quem o fere,
e suportar as afrontas.
Porque o Senhor não repele para sempre.
Após haver afligido, tem compaixão,
porque é grande a sua misericórdia.
MEDITAÇÃO
“Humilhou-Se a Si mesmo, feito obediente até à morte e morte de cruz” (Flp 2, 8). Cada estação deste Caminho é uma pedra miliar desta obediência e deste aniquilamento.
A medida deste aniquilamento, vemo-la quando começamos a ouvir as palavras do profeta: “O Senhor carregou sobre Ele a iniquidade de todos nós…Todos nós andávamos desgarrados como ovelhas, cada um seguia o seu caminho; o Senhor carregou sobre Ele a iniquidade de todos nós” (Is 53, 6).
A medida deste aniquilamento, calculamo-la quando vemos Jesus cair de novo, pela terceira vez, sob a Cruz. Medimo-la ao meditarmos quem é Aquele que cai, quem é Aquele que jaz no pó da estrada sob a Cruz, caído aos pés de gente hostil que não Lhe poupa humilhações e ultrajes…
Quem é Aquele que cai? Quem é Jesus Cristo? “Ele que era de condição divina, não reivindicou o direito de ser equiparado a Deus. Mas despojou-Se a Si mesmo tomando a condição de servo, tornando-Se semelhante aos homens. Tido pelo aspecto como homem, humilhou-Se a Si mesmo, feito obediente até à morte e morte de cruz” (Flp 2, 6-8).
ACLAMAÇÕES
Cristo Jesus,
Vós provastes o amargor da terra
para mudar o gemido da dor em cântico de júbilo.
R. Christe, eleison.
Cristo Jesus,
que Vos humilhastes na carne
para enobrecer toda a criação.
R. Christe, eleison.
Todos:
Pater noster, qui es in cælis;
sanctificetur nomen tuum;
adveniat regnum tuum;
fiat voluntas tua, sicut in cælo et in terra.
Panem nostrum cotidianum da nobis hodie;
et dimitte nobis debita nostra,
sicut et nos dimittimus debitoribus nostris;
et ne nos inducas in tentationem;
sed libera nos a malo.
Eia, Mater, fons amoris,
me sentire vim doloris
fac, ut tecum lugeam.
DÉCIMA ESTAÇÃO
JESUS É DESPOJADO DOS SEUS VESTIDOS
V. Adoramus te, Christe, et benedicimus tibi.
R. Quia per sanctam crucem tuam redemisti mundum.
Do Evangelho de S. Marcos 15, 24
Os soldados repartiram entre si os seus vestidos,
sorteando-os para verem
o que levava cada um.
MEDITAÇÃO
Quando vemos Jesus sobre o Gólgota, despojado dos seus vestidos (cf. Mc 15, 24; etc), o pensamento volta-se para sua Mãe: torna atrás, à origem deste corpo, que já agora, antes da crucifixão, é todo ele uma chaga viva (cf. Is 52, 14). O mistério da Encarnação: o Filho de Deus toma o seu corpo do seio da Virgem (cf. Mt 1, 23; Lc 1, 26-38). O Filho de Deus fala com o Pai, usando as palavras dum salmo: “Não quiseste sacrifício nem oblação, mas preparaste-Me um corpo” (Sal 40/39, 7; Heb 10, 5). O corpo do homem manifesta a sua alma. O corpo de Cristo exprime amor para com o Pai: “Então Eu disse: Eis que venho (…) para fazer, ó Deus, a tua vontade” (Sal 40/39, 9; Heb 10, 7). “Eu sempre faço o que é do agrado d’Ele” (Jo 8, 29). Este corpo despojado cumpre a vontade do Filho e a do Pai em cada chaga, cada guinada de dor, cada músculo dilacerado, cada fio de sangue que corre, o cansaço total dos braços, as pisaduras do pescoço e das costas, uma terrível dor nas têmporas. Este corpo cumpre a vontade do Pai, quando é despojado dos vestidos e tratado como objecto de suplício, quando encerra em si a dor imensa da humanidade profanada.
O corpo do homem é profanado de vários modos.
Nesta estação, devemos pensar na Mãe de Cristo, porque, junto do seu coração, nos seus olhos, entre as suas mãos, o corpo do Filho de Deus recebeu plena adoração.
ACLAMAÇÕES
Jesus, corpo sagrado,
profanado ainda nos vossos membros vivos.
R. Kyrie, eleison.
Jesus, corpo entregue por amor,
dividido ainda nos vossos membros.
R. Kyrie, eleison.
Todos:
Pater noster, qui es in cælis;
sanctificetur nomen tuum;
adveniat regnum tuum;
fiat voluntas tua, sicut in cælo et in terra.
Panem nostrum cotidianum da nobis hodie;
et dimitte nobis debita nostra,
sicut et nos dimittimus debitoribus nostris;
et ne nos inducas in tentationem;
sed libera nos a malo.
Fac ut ardeat cor meum
in amando Christum Deum,
ut sibi complaceam.
DÉCIMA PRIMEIRA ESTAÇÃO
JESUS É PREGADO NA CRUZ
V. Adoramus te, Christe, et benedicimus tibi.
R. Quia per sanctam crucem tuam redemisti mundum.
Do Evangelho de S. Marcos 15, 25-27
Eram as nove da manhã quando O crucificaram.
Na inscrição que indicava o motivo da sua condenação, lia-se:
“O Rei dos judeus”.
Com Ele crucificaram dois salteadores,
um à sua direita e o outro à sua esquerda”.
MEDITAÇÃO
“Trespassaram as minhas mãos e os meus pés; posso contar todos os meus ossos” (Sal 22/21, 17-18). “Posso contar…”: palavras verdadeiramente proféticas! É que este corpo é o preço dum resgate. Um grande resgate é todo este corpo: as mãos, os pés, e cada osso. Todo o Homem sujeito à máxima tensão: esqueleto, músculos, sistema nervoso, cada órgão, cada célula, tudo posto na máxima tensão. “Eu, quando for levantado da terra, atrairei todos a Mim” (Jo 12, 32).
Eis as palavras que exprimem a plena realidade da crucifixão. Desta faz parte também esta tensão terrível que atravessa as mãos, os pés e todos os ossos: terrível tensão do corpo inteiro, que, pregado como um objecto às traves da Cruz, está para chegar ao estremo do aniquilamento nas convulsões da morte. E na realidade da crucifixão entra também todo o mundo que Jesus quer atrair a Si (cf. Jo 12, 32). O mundo fica sujeito à gravitação do corpo, que por inércia tende para baixo.
É precisamente nesta gravitação que está a paixão do Crucificado.
“Vós sois cá de baixo, Eu sou lá de cima” (Jo 8, 23). Eis as suas palavras da Cruz: “Perdoa-lhes, ó Pai, porque não sabem o que fazem” (Lc 23, 34).
ACLAMAÇÕES
Cristo, crucificado pelo ódio,
pelo amor feito sinal de reconciliação e de paz.
R. Christe, eleison.
Cristo, com o sangue derramado na Cruz,
resgatastes o homem, o mundo, o universo.
R. Christe, eleison.
Todos:
Pater noster, qui es in cælis;
sanctificetur nomen tuum;
adveniat regnum tuum;
fiat voluntas tua, sicut in cælo et in terra.
Panem nostrum cotidianum da nobis hodie;
et dimitte nobis debita nostra,
sicut et nos dimittimus debitoribus nostris;
et ne nos inducas in tentationem;
sed libera nos a malo.
Sancta Mater, istud agas,
crucifixi fige plagas,
cordi meo valide.
DÉCIMA SEGUNDA ESTAÇÃO
JESUS MORRE NA CRUZ
V. Adoramus te, Christe, et benedicimus tibi.
R. Quia per sanctam crucem tuam redemisti mundum.
Do Evangelho de S. Marcos 15, 33-34.37.39
Chegado ao meio-dia,
houve trevas por toda a terra,
até às três da tarde.
Às três horas, Jesus exclamou em alta voz:
“Eloì, Eloì, lema sabactàni?”
que quer dizer:
Meu Deus, meu Deus, porque Me abandonaste? (…)
Soltando um grande brado, Jesus expirou. (…)
Ao vê-Lo expirar daquela maneira,
o centurião, que se encontrava em frente d’Ele, exclamou:
“Verdadeiramente este homem era o Filho de Deus”.
MEDITAÇÃO
Eis o agir mais alto, mais sublime do Filho em união com o Pai. Sim, em união, na mais profunda união… precisamente quando grita: “Eloì, Eloì, lema sabactàni?”, “Meu Deus, meu Deus, porque Me abandonaste?” (Mc 15, 34; Mt 27, 46). Este agir exprime-se na verticalidade do corpo estendido ao longo da trave perpendicular da Cruz com a horizontalidade dos braços estendidos ao longo do madeiro transversal. A pessoa que olha estes braços pode pensar com quanto esforço eles abraçam o homem e o mundo.
Abraçam.
Eis o homem. Eis o próprio Deus. “N’Ele (…) vivemos, nos movemos e existimos” (Act 17, 28). N’Ele, nestes braços estendidos ao longo da trave horizontal da Cruz.
O mistério da Redenção.
Jesus, pregado na Cruz, imobilizado nesta terrível posição, invoca o Pai (cf. Mc 15, 34; Mt 27, 46; Lc 23, 46). Todas as suas invocações testemunham que Ele está unido com o Pai. “Eu e o Pai somos um” (Jo 10, 30); “Quem Me vê, vê o Pai” (Jo 14, 9); “Meu Pai trabalha continuamente e Eu também trabalho” (Jo 5, 17).
ACLAMAÇÕES
Filho de Deus, recordai-Vos de nós
na hora suprema da morte.
R. Kyrie, eleison.
Filho do Pai, recordai-Vos de nós
e com o vosso Espírito renovai a face da terra.
R. Kyrie, eleison.
Todos:
Pater noster, qui es in cælis;
sanctificetur nomen tuum;
adveniat regnum tuum;
fiat voluntas tua, sicut in cælo et in terra.
Panem nostrum cotidianum da nobis hodie;
et dimitte nobis debita nostra,
sicut et nos dimittimus debitoribus nostris;
et ne nos inducas in tentationem;
sed libera nos a malo.
Vidit suum dulcem Natum
morientem desolatum
dum emisit spiritum.
DÉCIMA TERCEIRA ESTAÇÃO
JESUS É DESCIDO DA CRUZ
V. Adoramus te, Christe, et benedicimus tibi.
R. Quia per sanctam crucem tuam redemisti mundum.
Do Evangelho de S. Marcos 15, 42-43.46
Ao cair da tarde,
José de Arimateia, respeitável membro do Conselho,
que também esperava o Reino de Deus, (…)
depois de comprar um lençol,
desceu o corpo de Jesus da cruz
e envolveu-o nele.
MEDITAÇÃO
Ao ver o corpo de Jesus ser tirado da Cruz e colocado nos braços de sua Mãe, diante dos nossos olhos repassa o momento em que Maria recebeu a saudação do anjo Gabriel: “Hás-de conceber no teu seio e dar à luz um filho, ao qual porás o nome de Jesus. (..) O Senhor Deus dar-Lhe-á o trono de seu pai David (…) e o seu reinado não terá fim” (Lc 1, 31-33). Maria disse apenas: “Faça-se em mim segundo a tua palavra” (Lc 1, 38), como se desde então tivesse querido exprimir o que está a viver agora.
No mistério da Redenção, entrelaçam-se a Graça, isto é, o dom do próprio Deus, e “o pagamento” do coração humano. Neste mistério, somos enriquecidos por um Dom do alto (cf. Tg 1, 17) e ao mesmo tempo comprados pelo resgate do Filho de Deus (cf. 1 Cor 6, 20; 7, 23; Act 20, 28). E Maria, tendo sido mais do que ninguém enriquecida de dons, paga mais também. Com o coração.
A este mistério está unida a promessa maravilhosa formulada por Simeão aquando da apresentação de Jesus no templo: “Uma espada trespassará a tua alma, a fim de se revelarem os pensamentos de muitos corações” (Lc 2, 35).
Também isto se cumpre. Quantos corações humanos se abrem diante do coração desta Mãe que pagou tanto!
E de novo Jesus está todo inteiro nos seus braços, como esteve no presépio de Belém (cf. Lc 2, 16), durante a fuga para o Egipto (cf. Mt 2, 14), em Nazaré (cf. Lc 2, 39-40). Senhora da Piedade.
ACLAMAÇÕES
Santa Maria, mãe de imensa piedade,
convosco abrimos os braços à Vida
e, suplicantes, imploramos:
R. Kyrie, eleison.
Santa Maria, mãe e companheira do Redentor,
em comunhão convosco acolhemos Cristo
e, cheios de esperança, invocamos:
R. Kyrie, eleison.
Todos:
Pater noster, qui es in cælis;
sanctificetur nomen tuum;
adveniat regnum tuum;
fiat voluntas tua, sicut in cælo et in terra.
Panem nostrum cotidianum da nobis hodie;
et dimitte nobis debita nostra,
sicut et nos dimittimus debitoribus nostris;
et ne nos inducas in tentationem;
sed libera nos a malo.
Fac me vere tecum flere,
Crucifixo condolere,
donec ego vixero.
DÉCIMA QUARTA ESTAÇÃO
JESUS É DEPOSITADO NO SEPULCRO
V. Adoramus te, Christe, et benedicimus tibi.
R. Quia per sanctam crucem tuam redemisti mundum.
Do Evangelho de S. Marcos 15, 46-47
José de Arimateia
envolveu o corpo de Jesus num lençol.
Em seguida, depositou-O num sepulcro cavado na rocha
e rolou uma pedra
contra a porta do sepulcro.
Maria de Magdala
e Maria, mãe de José,
observaram onde O depositaram.
MEDITAÇÃO
Desde que o homem, por causa do pecado, foi afastado da árvore da vida (cf. Gn 3, 23-24), a terra tornou-se um cemitério. Há tantos homens como sepulcros. Um grande planeta de túmulos.
Nas proximidades do Calvário, havia um túmulo que pertencia a José de Arimateia (cf. Mt 27, 60). Neste túmulo, com o consentimento de José, colocou-se o corpo de Jesus depois de descido da Cruz (cf. Mc 15, 42-46; etc.). Depositaram-no à pressa, de modo que a cerimónia terminasse antes da festa da Páscoa (cf. Jo 19, 31), que começava ao pôr do sol.
Dentre todos os túmulos espalhados pelos continentes do nosso planeta, há um onde o Filho de Deus, o homem Jesus Cristo, venceu a morte com a morte. “O mors! Ero mors tua!”, “Ó morte, Eu serei a tua morte” (1ª antífona das Laudes de Sábado Santo)”. A árvore da Vida, da qual o homem foi afastado por causa do pecado, revelou-se novamente aos homens no corpo de Cristo. “Se alguém comer deste pão viverá eternamente; e o pão que Eu hei-de dar é a minha carne pela vida do mundo” (Jo 6, 51).
Embora o nosso planeta esteja sempre a repovoar-se de túmulos, embora cresça o cemitério no qual o homem volta ao pó donde tinha sido tirado (cf. Gn 3, 19), todavia todos os homens que olham para o túmulo de Jesus Cristo vivem na esperança da Ressurreição.
ACLAMAÇÕES
Jesus Senhor, nossa ressurreição,
no sepulcro novo destruís a morte e dais a vida.
R. Kyrie, eleison.
Jesus Senhor, nossa esperança,
o vosso corpo crucificado e ressuscitado é a nova árvore da vida.
R. Kyrie, eleison.
Todos:
Pater noster, qui es in cælis;
sanctificetur nomen tuum;
adveniat regnum tuum;
fiat voluntas tua, sicut in cælo et in terra.
Panem nostrum cotidianum da nobis hodie;
et dimitte nobis debita nostra,
sicut et nos dimittimus debitoribus nostris;
et ne nos inducas in tentationem;
sed libera nos a malo.
Quando corpus morietur,
fac ut animæ donetur
paradisi gloria. Ame.