Tende consciência de que fostes resgatadas da vida fútil herdada de vossos pais, não por coisas perecíveis, como a prata ou o ouro, mas pelo precioso sangue de Cristo, cordeiro sem defeito e sem mancha (Pd 1,18-19). Assim exortava o Apóstolo Pedro aos fiéis, apresentando-lhes o mistério de nossa redenção sob uma das imagens mais conhecidas: o resgate, realizado por meio do sangue de Cristo. Sabemos que nossa Redenção, realizada pelo Bom Jesus, constitui-se um mistério, isto é, uma realidade sobrenatural que ultrapassa o limite de nossa compreensão. As imagens ou comparações feitas nos ajudam a perceber elementos desse mistério, que, todavia, estará sempre aberto a uma compreensão mais profunda. Uma dessas imagens é a do resgate. Trata-se de uma imagem, não de uma apresentação completa do mistério da redenção (o que, aliás, nem seria possível), por deve-se prestar atenção aos limites que lhe são próprios e que poderiam nos levar a graves equívocos.
Um dos limites seria fixar-se no aspecto do pagamento propriamente dito. Quem recebeu Sangue de Cristo em pagamento por nós? Quem nos mantinha prisioneiros? Se pensarmos bem, veremos que é impossível dizer que o resgate tenha sido pago a Deus. Deus não nos mantinha prisioneiro e muito menos desejava o Sangue do seu Filho amado em resgate por nós. A idéia de um Deus sequioso de Sangue de Jesus, aplacado por está sangue, soa até blasfêmia. Tratando de nossa redenção, quando se refere a Deus, a imagem do sacrifício realizado por Cristo tem mais sentido (embora também precise ser corretamente entendida). Também não podemos pensar em nosso resgate, pago por Deus ao diabo com o Sangue de Cristo. O diabo nunca teve direito algum sobre nós, para que merecesse receber algo em troca. Toda ação dos demônios constitui-se num abuso, não num direito. E, no mais, o que faria do diabo com o Sangue Sagrado de Cristo? Tratado de nossa Redenção, quando se refere ao diabo, a imagem da luta, da vitória de Cristo sobre os demônios é mais adequada que a do resgate.
As perguntas feitas estão fora de foco, olham a imagem do resgate por um ângulo errado. Evidentemente, não houve pagamento algum em que o sangue de Cristo fosse à moeda usada. O que quer dizer, então, dessa imagem? Primeiramente, quem está prisioneiro e necessita ser resgatado, não pode fazer nada por si mesmo, depende inteiramente de outro que o salve. Assim também nós éramos totalmente incapazes de obter por nós mesmos nossa salvação; necessitávamos recebê-la de Outro, do salvador. É por graça que fostes salvos! (Ef 2,5). Em segundo lugar, o resgate que alguém paga por outro, não é algo que ele faz em benefício próprio, mas em benefício de quem precisa ser resgatado. Do mesmo modo, a salvação que nos foi oferecida não resultou em benefício a Jesus, mas a nós. Com a sua encarnação, cruz e ressurreição, cristo não buscou a própria satisfação (Rm 15,3), mas buscou o nosso bem, a nossa salvação. Por fim, o resgate é algo custoso a quem o paga. Assim também, nossa salvação não foi algo indiferente para Deus, não foi feita por decreto, mas custou enorme esforço, renúncia, sofrimento. Formos reconciliados com Deus pela morte de seu filho (Rm 5,10). Bem entendida a imagem do resgate realizado pelo Sangue de Cristo nos ajuda compreender um pouco melhor o mistério da Redenção e sermos mais agradecidos ao Redentor.
Artigo extraído do Devocionário ao
Preciosíssimo Sangue de Jesus